cinzeiro...

Então, depois de algum tempo, eu voltei a ativa.
Não como queriam
E sim, sendo eu mesmo
já sem medo de dizer o que penso
Aind'assim, tenso
Contraindo
a boca como o arco
prestes a disparar blasfêmias

talvez um pouco áspero, mas sincero
um copo grande de vinho e um cinzeiro cheio
O maço vazio e o cheiro
que talvez sintam da minha boca... Meu jeito
não mudou nem por aquela moça
Não-fumante
declarou não gostar nem um pouco
um beijo oco...
Vazio...
tragando minha fé, como um buraco negro
redemoinho...

tentando não lembrar, a raiva ainda vem:
'Esse beijo, que lembra banana verde'
garganta seca e olhos molhados...
Mais um chute na minha história foi colecionado....

uma semana já se havia passado

sábado, 27 de novembro de 2010

Rock and Roll

Meu cabelo se mexia insistentemente, fazendo escapar o calor que eu tentava manter agarrado à minha nuca. E eu, besta como só gente deslumbrada consegue ficar, passei o tempo todo pensando no frio gostoso que batia na minha cara, enquanto anotava mentalmente a tarefa de comprar uma jaqueta daquelas, de couro, como as que todos ao meu redor usavam. A imagem daquela roupa, pesando nos meus ombros, tão fora de mim, me levou a rir sem quê nem mais, numa expressão melancólica que mentes bêbadas e sóbrias dificilmente compreenderiam, ainda mais naquela rua cercada por noite escura, de luz fosca e fugidia, na qual eu mal enxergava a mim mesma, quem diria o sorriso dos outros. Mas engraçado como todo aquele espaço, aqueles grupos, aquelas jaquetas, expiravam, transpiravam, regurgitavam, rock. A música só estava, efetivamente, presente na mente e celulares ligados em mãos e cérebros suados de álcool. As caixas de som, estranhamente desligadas, não explodiam em acordes ou solos agudos, nem me faziam tremer com as notas do baixo. O chão estava firme e eu podia, ironicamente, ouvir meus próprios sapatos, tamborilando no asfalto, tentando fazer música com uma só nota. Mas olhando em volta, respirando com calma, sentindo os braços se fecharem em mim, protegendo-me inconscientemente do frio que fazia arder no corpo, foi fácil perceber como é que a música passa a criar vida fora do intangível, ganhando características palpáveis, palatáveis, degustáveis, reais. A cor preta, a maquiagem carregada, as motos, as lutas, as bebidas, as expressões, a postura, a habilidade única de instigar medo para quem está de fora, confiança para quem está dentro, e risadas, para quem quer que preste atenção. Amizades. Força. E as jaquetas. Ou, em uma palavra, rock. Não ouvir rock, mas ser rock. Ser música em um nível que, para mim, é intangível. Mas então, no meio da madrugada, isso já não importava, e eu me deliciei com o vento cortante que já fazia sangrar minha nuca. Sonhei acordada com uma jaqueta de couro quando percebi, atônita, que as caixas de som, ainda silenciosas, explodiam sim em acordes e solos agudos, o chão, nada firme, me fazia tremer com as notas do baixo, e o tamborilar do meu sapato no asfalto encontrava outras notas para acompanhá-lo. Todos sons executados pelos espíritos bêbados e livres de cada uma daquelas pessoas. Agradeço mentalmente a existência deles, que me permitiram tatear, cheirar, degustar, enxergar o rock. O sorriso que me deforma o rosto é um tanto quanto indecifrável, mas tudo bem. Graças à luz fosca e fugidia ninguém me percebe. Ou, melhor dizendo, graças a tudo estar tão imerso em rock ninguém consegue perceber mais nada, e, pensando bem, ninguém precisa ver mais nada. O rock se basta. O rock nos basta. E, mesmo se não bastasse, temos ainda álcool e, claro, as jaquetas de couro.


Mariana Martins

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